O que é plebiscito referendo e iniciativa popular

No próximo dia 5 de outubro a Constituição brasileira completa 27 anos. A Carta Magna, que ficou conhecida como Constituição Cidadã, garantiu direitos fundamentais aos cidadãos como o de ir e vir e o de liberdade de expressão. Assegurou, inclusive, que eles seriam impossíveis de serem mudados. Com a promulgação do texto, direitos políticos também foram assegurados à população. Os brasileiros puderam votar novamente para eleger cargos do Executivo, como o de presidente da República.

A fim de possibilitar uma participação cada vez maior do povo no processo político, foram incluídos, ainda, na Constituição, três dispositivos: o plebiscito, o referendo e a possibilidade de que a população apresentasse projetos de lei. Os dois primeiros são formas de consulta ao povo, tendo, como principal diferença, a ordem da criação da proposta que será analisada pelo povo. Enquanto o plebiscito é convocado antes da apresentação do texto, o referendo é uma espécie de confirmação ou rejeição pela sociedade do que foi proposto pelos governantes.

Já a lei de iniciativa popular possibilita que a sociedade apresente um projeto de lei à Câmara dos Deputados, desde que ele seja assinado por, no mínimo, 1% dos eleitores distribuídos por, pelo menos, cinco estados brasileiros, sendo pelo menos 0,3% em cada um desses estados. A última proposta dessa natureza que foi convertida em lei pelo Congresso, foi a Lei da Ficha Limpa, em 2010. A norma veta a candidatura de políticos condenados.

Mas será que apenas o direito ao voto ou as outras medidas apresentadas na Constituição são suficientes para uma participação efetiva da população na política? Após quase três décadas da promulgação do texto que garantiu tantos benefícios aos cidadãos brasileiros, o que ainda precisa ser aprimorado quanto à participação popular?

Para o deputado Chico Alencar, do Psol do Rio de Janeiro, a democracia no Brasil é de pequena intensidade e essa situação é consequência da história do país. Ele relembrou a ausência da população na proclamação da República, em novembro de 1889:

“Mesmo com a República, cujo nome indica governo do povo, a presença popular foi muito pequena. Não só no ato da proclamação da República. Segundo Aristides Lobo, que depois foi até ministro do governo provisório, o povo assistiu bestializado àqueles eventos, imaginando que seria, talvez, uma parada militar.”

Chico Alencar explica que desde 1984 o país vem construindo esse processo de democratização. Entretanto, acredita que até hoje o Brasil conta com uma democracia pouco participativa e uma república que não insere todos os setores da população:

“Há um processo permanente de contenção da presença do povo nos centros decisórios. Mesmo no Congresso Nacional as maiorias sociais não são as maiorias políticas.”

A professora de jornalismo da Universidade de Brasília, Márcia Marques, vivenciou o período do retorno ao voto para presidente, em 1989. Apesar do advento do voto ter sido importante naquele momento, a professora acredita que ele não é suficiente nos dias de hoje para que a população possa participar ativamente da vida política:

“Existem já conferências nacionais, existem coletivos que se organizam em torno de participação para resolver problemas locais, mas a gente precisa pensar num modo de fazer política que amplie e que permita essa participação mais efetiva da população.”

Aliar a possibilidade dada à população de propor leis, que a Constituição garantiu em 1988, com a proliferação das redes sociais nos últimos anos pode ser uma boa alternativa para ampliar a presença da sociedade nos espaços de Poder. É o que defende a professora Márcia Marques, que também é doutora em Ciência da Informação:

“Talvez esse caminho, dessa discussão que a Constituinte trouxe, pudesse ser mais aprofundado e mais pensado no sentido também de poder utilizar as redes, as mídias sociais para participação.”

O deputado Bonifácio de Andrada, do PSDB de Minas Gerais, que participou da elaboração da Constituinte em 1987, se queixou da falta de compromisso do Poder Público para fazer valer a vontade popular quando um plebiscito ou referendo é proposto. Ele lembrou o referendo que questionou a sociedade sobre a comercialização de armas de fogo e munições no Brasil:

“O povo ficou favorável a que as pessoas tivessem armar para se defender e o governo mandou para a Câmara um projeto contra os direitos do indivíduo para se defender com as suas respectivas armas.”

No entanto, Bonifácio de Andrada acredita que esses dispositivos, de modo geral, são importantes. Principalmente quando se leva em conta a necessidade do povo ter diretamente a sua presença nas decisões nacionais. O deputado comentou ainda a importância do referendo para o fortalecimento da democracia participativa:

“O referendo também, em alguns casos, o referendo é valoroso. Sobretudo em algumas operações constitucionais porque ele dá apoio à decisão do Congresso de matéria de interesse popular.”

Desde a promulgação da Constituição, em 1988, já foram feitas três consultas ao povo: dois plebiscitos e um referendo. O retorno à monarquia e a mudança do sistema presidencialista para o parlamentarista estão entre os temas em que a vontade popular foi consultada.

Quanto aos projetos de lei de iniciativa popular, quatro já foram convertidos em lei pelo Congresso Nacional. Além da criação da Lei da Ficha Limpa, em 2010, a chacina realizada por esquadrão da morte foi caracterizada como crime hediondo por conta da primeira proposta dessa natureza apresentada na Casa, em 1994.

Além do que está previsto na Constituição, a Câmara dos Deputados também possui dispositivos que possibilitam a participação da população nas decisões que impactam diretamente a vida delas. Confira, no segundo capítulo da Reportagem Especial.

Dois instrumentos de consulta popular que contribuem para a efetivação da democracia, tanto o plebiscito quanto o referendo são palavras que ainda provocam dúvidas na maioria das pessoas. Você sabe identificar a principal diferença entre eles?

Disponível no Portal do Tribunal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Glossário Eleitoral Brasileiro esclarece que plebiscito e referendo são consultas feitas ao povo para que delibere sobre matéria relevante, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa. Tais iniciativas são direitos políticos previstos nos incisos I e II do artigo 14 da Constituição Federal de 1988.

O plebiscito é convocado pelo Congresso Nacional antes da edição de um ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo se manifestar, por meio de voto, pela aprovação ou não do texto apresentado. Já o referendo é realizado após o ato, cabendo à sociedade ratificar ou não a questão colocada para a sua avaliação.

O Glossário

O Glossário Eleitoral explica ao público as expressões costumeiramente adotadas pelos operadores do Direito Eleitoral. O serviço esclarece, de maneira simples e direta, diferentes conceitos, bem como oferece informações históricas e referências doutrinárias sobre o desenvolvimento do processo eleitoral brasileiro.

Os mais de 300 verbetes do serviço estão dispostos em ordem alfabética, o que facilita a pesquisa pela cidadã e pelo cidadão.

AL/EM

O exercício do voto para eleger representantes nas casas legislativas ou no Poder Executivo não é a única forma que as cidadãs e os cidadãos têm de participar do processo democrático. O povo também pode ser chamado para ir às urnas, em plebiscitos e referendos, a fim de ser ouvido em matérias de relevância para a nação em questões de natureza constitucional, legislativa ou administrativa.

A diferença entre esses dois tipos de consulta popular é bem simples e se dá no momento cronológico da criação de leis ou da implementação de atos administrativos em que o povo é consultado. O plebiscito ouve a população, de modo prévio, sobre matéria de iniciativa legislativa ou administrativa que ainda esteja em fase de discussão e que não tenha sido concretizada. Já o referendo, por sua vez, busca confirmar ou rejeitar, posteriormente, ato administrativo que já foi implementado ou legislação que já esteja vigorando.

Ambos estão previstos no artigo 14 da Constituição Federal, que os cita como meios para o exercício da soberania popular mediante o sufrágio universal e o voto secreto e direto. Plebiscitos e referendos são regulamentados pela Lei nº 9.709/1998, que estabelece os critérios para a convocação de consulta popular.

A lei determina, por exemplo, que a convocação de uma consulta popular de relevância nacional ocorra por meio de um decreto legislativo proposto por pelo menos um terço dos membros de uma das casas do Congresso Nacional. Nos casos de incorporação, subdivisão, desmembramento ou anexação de estados, ou formação de novos estados ou territórios federais, a convocação é feita por meio de lei complementar, ouvidas as assembleias legislativas envolvidas.

Estados e municípios também podem realizar plebiscitos ou referendos. Nesses casos, a iniciativa parte das respectivas assembleias legislativas ou câmaras de vereadores, nos termos das suas constituições estaduais ou leis orgânicas.

Consultas populares na história do Brasil

Em diversas ocasiões, as brasileiras e os brasileiros foram chamados às urnas para se fazerem ouvir em relação a leis ou atos administrativos que interessavam a toda a população. Por exemplo, em 1963, o povo se pronunciou, em um referendo, contra a emenda constitucional que havia instituído o regime parlamentarista no Brasil, logo após a posse de João Goulart na Presidência da República.

Também em um referendo, a população rejeitou, em 2005, a alteração do Estatuto do Desarmamento, que proibia a comercialização de armas e munição no país, salvo em casos específicos expressos em lei.

Já em 1993, as cidadãs e os cidadãos foram às urnas para escolher, num plebiscito, a forma e o regime de governo que vigorariam no país: república ou monarquia; e presidencialismo ou parlamentarismo. A realização desse plebiscito cumpriu um dispositivo da Constituição Federal de 1988 que fazia referência a outro, constante da Constituição Federal de 1891, a primeira da República.

A proposta da divisão do território do Pará em três outras unidades da Federação – os estados de Carajás e Tapajós – chamou os paraenses em 2011 para manifestarem se concordavam com ela ou não. A ideia foi rejeitada em todas as regiões envolvidas.

É possível saber mais sobre plebiscitos e referendos que já foram realizados no Brasil nos últimos anos no Portal do TSE na internet.

RG/LC, DM